Palhaçaria

Palhaço é para fazer rir. Se não fizer rir, não é palhaço. Esta é uma definição simples do significado de uma arte tão antiga quanto universal. Harris, Benjamim de Oliveira, Polidoro, Dudu das Neves, Piolin, Arrelia, Pimentinha, Torresmo, Pururuca, Xamêgo e Picolino, entre outros, são grandes palhaços que o Brasil já teve. Todos eles, antes de pintar o rosto, tiveram que aprender muito dos segredos desta profissão cheia de magia e encantamento. É uma tradição ser anunciada como a alegria do Circo.
Na tradição circense o palhaço deve ser o artista mais completo de todos, pois além de dominar as técnicas específicas da comicidade, deve ainda dominar a maior quantidade de outras técnicas possíveis.
Há uma certa confusão quando se fala de palhaços, da década de 80 do século passado até hoje, foi o fato de que alguns artistas deixaram de traduzir a palavra inglesa clown, que quer dizer palhaço, para tentar definir o seu trabalho, também cômico, de modo diferente. Fala-se muito, por exemplo, em “trabalho de clowns”, ou mesmo uma suposta diferença entre “palhaço de picadeiro e de palco”. É importante deixar explicado: Clown e Palhaço são a mesma coisa. Ambos representam o que a humanidade tem de ridículo.
O nome em inglês Clown provavelmente deriva de cloud, que significa nuvem, ou o que anda nas nuvens, o avoado e distraído. Para alguns estudiosos a palavra vem da mesma raiz de country, o campo de onde vem o campônio, o homem de origem humilde e camponesa, que pela ingenuidade em relação à vida na cidade, também indica a origem da palavra e da figura do palhaço.
De onde vem o termo que utilizamos no Brasil?
A origem da palavra Palhaço é italiana. Na época das caravanas medievais e das feiras que originaram as cidades, os artistas de rua procuravam atrair o público através de imagens e figuras que eram mais comuns a todos, na sua grande maioria, camponeses. Os artistas, para atraí-los, vestiam-se de espantalhos, colocando palha presa às suas roupas. Muitas vezes colocavam também farinha na cara para deixarem seus rostos parecidos com o tecido da cara dos espantalhos.
Os camponeses chamavam a estes artistas de homens de palha, os palhaços. Daí o nome. Alguns historiadores afirmam também que alguns acrobatas costuravam palha em suas roupas para amortecer o impacto de suas quedas em saltos. Porém, não seria possível essa teoria, pois uma roupa com este conteúdo praticamente impossibilitaria o acrobata de fazer evoluções. Além do fato de o nome Palhaço foi adotado para designar os que faziam graça e não aos que faziam saltos.
Os Vários Tipos de Palhaços


A arte da Palhaçaria, que se confunde com a própria imagem do Circo, é uma representação cênica que possui vários tipos e diferentes formas ao longo da História. Está presente em todas as Culturas.
Palhaço não é um personagem e, sim, um arquétipo. Arché vem do grego e quer dizer princípio, fonte ou protótipo, ou seja, a primeira versão de algo ou alguém. No caso do Palhaço, representa o tipo que mistura ingenuidade e, contraditoriamente, esperteza, para representar a incapacidade humana de não acertar mesmo tentando fazer o que considera certo. É essencialmente o tipo que faz rir. Não o único que faz rir, mas aquele que principalmente faz rir.
Aqui no Picadeiro Central do Mundo do Circo estão os principais tipos de palhaços.
Brincante / Jester / Joker / Fool
Entre as origens da arte da Palhaçaria está o Jester. Diferente do Bufão, que trabalha a comicidade a partir da dor, o Jester é o brincalhão, símbolo de alegria e prazer. Representa a tolice e as bobagens, de onde vem o nome em inglês Fool, a partir dos Bobos-da-Corte. Joker, também em inglês, é a personagem que joga, que brinca.
Em suas diversas formas, sua graça acontece nas ruas, em desfiles ou festas, sem a pretensão de uma representação cênica em palco ou picadeiro.
No Brasil, uma variação específica de nossa Cultura, temos os Brincantes oriundos dos festejos populares, nas quais personagens como Mateus e Catirina, por exemplo, são as figuras cômicas que divertem o público.


Branco / Carabranca / Clown / Clum
Branco, assim definido pela maquiagem branca que cobre todo o rosto, é a representação cômica daquele que se coloca como superior e termina cometendo os mesmos erros do outro. Esse outro, em geral, é o Excêntrico num jogo entre ambos que levam às ações cômicas. Sua postura nobre, de figurinos elegantes e chapéu cônico, nunca admite que erra, representa o poder do mais rico em relação ao mais pobre.
No Brasil ganhou versões adaptadas, muitas vezes utilizando até o mesmo tipo de roupa que o Excêntrico. Também conhecido pelo termo Clown, palavra em Inglês que é o nome geral de Palhaço. Em Português falado no Brasil virou Clum.
Excêntrico / Augusto
Excêntrico é a representação mais conhecida de Palhaço. Com suas roupas largas, sapatos grandes e nariz vermelho, protagoniza os números e, na maioria das vezes, atua em dupla com um Branco. Sua graça e humor farsesco, muitas vezes vistos com lirismo, são baseados na figura de linguagem da hipérbole, onde o exagero marca suas ações.
Excêntrico, como o nome diz, é aquele que é fora de centro, deslocado de seu eixo, desajeitado, sempre tropeçando, falando bobagens e constantemente alegre. Representa aquele que erra e não percebe que erra. Sempre tentando escapar de perigos simboliza as dificuldades que vivem os mais pobres.
Palhaços Cantores
A utilização de vários recursos de outras linguagens artísticas sempre foi uma característica das artes circenses. Os palhaços, como representação cênica, sempre fizeram da Música um elemento importante para a cena. Palhaços músicos são chamados Excêntricos Musicais.
No Brasil, logo com a chegada dos primeiros Circos Europeus, na interação Cultural, em especial com brasileiros de origem africana, a canção tomou conta da cena da arte de Palhaçaria, quando surgiram os Palhaços Cantores.
Essa tradição, que difundiu no início do século XX as modinhas e lundus, se manteve até hoje. Palhaços importantes da História, como Arrelia, Torresmo e Carequinha, por exemplo, por terem programas na televisão, gravaram discos que fizeram muito sucesso.
Hoje, a indústria da cultura de massas explora a figura de Palhaço para produzir e vender no mercado de consumo músicas voltadas para crianças

Palhaça / Clonete
Na arte da palhaçaria, pela estrutura historicamente patriarcal e machista, as mulheres, ao longo da História, atuavam como Palhaços, ou seja, representavam o arquétipo masculino. Aqui no Brasil, as Clonetes, termo oriundo de Clown, tiveram pouca presença de destaque. Como foi o caso, por exemplo, de Xamêgo, da artista Maria Eliza Alves dos Reis, cuja história foi contada recentemente no documentário feito por sua neta Mariana Alves e a co-diretora Ana Minehira.
Nos últimos 50 anos a cena se transformou e se renovou a arte, abandonando o termo Clonete, pejorativo, passando a ser Palhaça, com representação feminina com os elementos básicos que compõem o arquétipo masculino, mas uma visão afirmativa e feminista.


Vagabundo / Tramp
Uma versão norte-americana de Palhaço é o Tramp. Representando um mendigo, não desenvolve cenas cômicas clássicas. Em geral, atua interagindo improvisadamente diretamente com o público na plateia, na maior parte das vezes passeando em torno no Picadeiro Central, comum nos E.U.A. que criou os Circos com três picadeiros ou mais. No Brasil, em raras representações, é chamado de Vagabundo, nome mais ligado à figura Chapliniana, do personagem Carlitos, criado por Charles Chaplin.

Chapiliniano
A criação de Carlitos, personagem que o gênio Charles Chaplin (1889-1977) criou no Cinema, influenciou e ainda influencia a arte da Palhaçaria no mundo inteiro. No Brasil, essa representação, que imita a figura de Carlitos, é bastante presente em cenas de Pantomima, somente gestuais ou com rara utilização de palavras. Também aparece em números de habilidades como auxílio e comicidade, comum em modalidades como Equilibrismo e Contorcionismo.


Toni de Sorriê / Soirée
Toni é também um nome em inglês que significa Palhaço. Sorriê, vem da palavra Soirée, em Francês, utilizada para definir as sessões noturnas dos espetáculos circenses. Nelas, os palhaços fazem humor em números de demonstração de habilidades. Toni de Sorriê é o artista que, com alto grau técnico, faz palhaçadas.
A arte da Palhaçaria, dentro dos Circos, sempre teve a paródia como ponto de partida para seu humor. A imitação cômica dos números de habilidades revelam como, apesar do artista de Circo trabalhar com a superação humana, sentimos medo e não somos tão habilidosos quanto imaginamos. Para a representação cômica, mesmo que paródica, o palhaço deve ter técnicas nas habilidades com as quais faz suas graças.
Nos Circos é comum se dizer que o palhaço deve ser o artista mais completo por ter que trabalhar com todas as habilidades.

Caracterização do Palhaço Brasileiro

O Circo brasileiro foi formado por famílias vindas principalmente da Europa, mais precisamente Itália, França e Espanha. No entanto, a caracterização, figurinos e maquiagem, aqui no Brasil, não seguiu a mesma divisão entre Branco e Excêntrico que ainda hoje se utiliza nestes países.
Na Europa Ocidental, o Branco utiliza uma roupa inteiriça, de pernas curtas, com forro preto ou branco, coberta por desenhos arabescos prateados ou dourados. Usa meias brancas longas e sapatilhas combinando com os arabescos. Sua maquiagem é feita cobrindo o rosto inteiro de branco, em geral com uma pequena figura geométrica vermelha na ponta do nariz e uma sobrancelha diferente da outra. Usa chapéu cônico branco.
Já o Excêntrico utiliza roupas largas, com estampas fortes e exageradas, mas que combinam as cores; têm sapatos grandes e gravatas desproporcionais. Pintam apenas algumas partes do rosto, contornando de branco a boca e/ou os olhos e usam um nariz vermelho, às vezes de bola. Enfim, é aquele que conhecemos por palhaço.
Aqui no Brasil, quando as primeiras famílias circenses europeias chegaram, ambas as funções, Branco e Excêntrico, pela falta de tecidos finos disponíveis no mercado, acabaram se caracterizando da mesma forma. Assim passou a predominar a vestimenta do Excêntrico, o que torna mais difícil a identificação de cada um em cena.